Mercadores da Noite #301: Alternância de poder

5 de novembro de 2022
Uma coisa é certa: Luiz Inácio terá de montar um governo de coalizão, caso queira ter sucesso em seu terceiro mandato. É dessa montagem que o Brasil que investe na renda variável quer saber. Saber e tirar conclusões.

Olá, leitor(a),

Antes de mais nada, é preciso frisar que nas eleições presidenciais deu empate. Ou quase empate. É o que se pode deduzir de 50,9% (Lula) a 49,1% (Bolsonaro).

Talvez se a Polícia Rodoviária Federal não tivesse sabotado o pleito no Nordeste, a vantagem de Lula fosse um pouquinho maior.

Por outro lado, se Bolsonaro não tivesse convocado o corpo diplomático ao palácio da Alvorada para dizer que o sistema eleitoral brasileiro não é confiável e se o tresloucado Roberto Jefferson não metralhasse uma viatura da Polícia Federal, episódios nos quais o capitão-presidente deve ter perdido muitos votos, quem sabe ele teria sido reeleito.

O fato é que deu Lula na contagem dos votos e é por ele que o Brasil será governado nos próximos quatro anos. É assim que a democracia funciona.

Uma coisa é certa: Luiz Inácio terá de montar um governo de coalizão, caso queira ter sucesso em seu terceiro mandato. É dessa montagem que o Brasil que investe na renda variável quer saber. Saber e tirar conclusões.

Vejamos como o poder se alternou em eleições passadas e como a B3 se comportou.

A passagem de bastão de Michel Temer para Jair Bolsonaro se deu com todas as características de civilidade e respeito de lado a lado.

Como já se sabia desde antes da facada em Juiz de Fora que o Posto Ipiranga (o apelido caiu em desuso) seria o responsável pela Economia, era dele que o mercado queria saber.

Entre a confirmação da contagem dos votos e a posse de Bolsonaro, que se deu em 1º de janeiro de 2019, o Ibovespa subiu sete por cento.

Não houve processo de transição entre Dilma Rousseff e Temer, já que ela foi cassada pelo Congresso. Mas se pegarmos o período entre o dia em que a Câmara dos Deputados autorizou o início do processo de impeachment e aquele no qual o Senado o transformou em fato consumado, o Ibovespa subiu formidáveis 30%.

Do momento em que Dilma foi eleita e 1º de janeiro de 2011, quando Lula lhe passou a faixa presidencial, nada aconteceu. Nem no mercado nem na política, já que era apenas uma troca de petista por outro.

Madame Rousseff inclusive fora ministra-chefe da Casa Civil do “chefe” e manteve boa parte do quadro de ministros, com apenas um ou outro trocando de pasta.

Poucas liturgias da história da política brasileira foram tão civilizadas como a transferência de governo entre Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.

Entre a vitória de Lula no segundo turno das eleições de 2002 e sua posse em 1º de janeiro de 2003, o ministro da Fazenda de FHC, Pedro Malan, entregou a seu sucessor, Antonio Palocci, todas as contas do governo.

Fernando Henrique e Ruth Cardoso mostraram a Lula e Marisa Leticia as instalações do palácio da Alvorada.

Embora um governo socialdemocrata estivesse sendo substituído por um de esquerda, o Ibovespa subiu 2%. Uma mixaria, mas subiu. Palocci prometeu aumentar a meta de superávit primário. Prometeu e cumpriu à risca.

Uma curiosidade dessa transição é que Lula sugerira a FHC aumentar seu mandato em cinco dias, passando a posse do dia 1º de janeiro (data muito inconveniente para que outros chefes de estado comparecerem) para o dia 6.

Fernando Henrique não concordou, alegando que cumpriria exatamente o tempo de mandato para o qual fora eleito.

A transição Itamar Franco/FHC também se deu normalmente, já que o tucano fora ministro das Relações Exteriores do mineiro e, mais tarde, da Fazenda, época em que foi concebido o Plano Real.

Desse ponto para trás é quase impossível fazer esse tipo de conta. Foi a época da hiperinflação, dos choques heterodoxos e das tablitas deflatoras. A Bolsa subir 30% em um mês podia não significar absolutamente nada, já que a desvalorização do cruzeiro, do cruzado, do cruzado novo, do novo cruzeiro etc. etc. não raro superava esse percentual. Aconteceu diversas vezes.

Bolsa de Valores naquela época era exclusividade de profissionais que sabiam fazer contas e projeções.

Durante os governos militares, não havia transição. Era apenas troca de comandante, camuflada por uma eleição no Congresso, troca essa da qual a gente ficava sabendo com vários meses de antecedência, como foi o caso da saída de Médici e entrada de Geisel.

Só pelo histórico das transições recentes, mesmo quando se deram de partidos com ideologias antagônicas, acho que a renda variável vai subir até a posse de Lula.

Depois disso, serão outros quinhentos. Dependerá de um aperto fiscal do novo governo. Isso sem forçar a barra no aumento de impostos, rompendo os paradigmas da curva de Lafer.

Sugiro que os investidores se atenham mais às perspectivas de resultados das empresas e se conscientizem que o pior do enfrentamento político já passou.

Um ótimo fim de semana para todos.

Ivan Sant’Anna.


Nota do editor: Além de assinar a Mercadores da Noite, que sai aos sábados aqui e em podcast nas plataformas Spotify e Deezer etc., Ivan Sant'Anna também escreve todas as segundas, terças e quintas-feiras a coluna Warm Up PRO e que você pode conhecer clicando aqui!

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Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

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