A Governança da BRF
Por João Abdouni
Caro (a) leitor (a),
A BRF aprovou, na última segunda-feira (17), a subscrição de 325 milhões de ações por meio de um follow-on, que ao preço atual chegaria a um valor próximo a 8 bilhões de reais, porém, as motivações para essa oferta devem criar uma disputa entre os sócios da companhia.
Para iniciarmos a discussão é importante recordar a estrutura acionária da BRF, assim como seu estatuto. A composição acionária da companhia é concentrada em alguns acionistas principais que juntos detêm cerca de 49,89% das ações da empresa, sendo eles:
O restante das ações representam o free float da companhia, mas a discussão principal se encontra referente aos seus maiores acionistas.
A Marfrig é a maior acionista da companhia com 31,66% das ações, número muito próximo aos 33,33% que entregariam à empresa de Marcos Molina o controle da BRF, porém, o estatuto societário da empresa dificulta esse movimento.
O que acontece é que a BRF possui no seu estatuto uma poison pill, uma cláusula de proteção aos acionistas minoritários. Ela estabelece que caso algum acionista ultrapasse o percentual de 33,33% das ações ele acaba sendo obrigado a lançar uma oferta pública de ações para aquisição do restante da empresa com um prêmio de 40% sobre a cotação média de 30 ou 120 dias anteriores.
Essa cláusula impedia que os interesses de Molina de assumir o controle da BRF fossem alcançados e, assim, fosse capaz de propor uma fusão entre as duas empresas. Apesar disso, o empresário parece ter achado uma brecha no estatuto da empresa.
Essa brecha estabelece que caso algum acionista ultrapasse o percentual enquanto a empresa esteja realizando um aumento de capital, como o aprovado na última segunda-feira, não obriga o poison pill a ser ativado. Dessa forma, com a OPA, além de diluir a participação dos minoritários, a Marfrig poderia assumir o controle da BRF sem pagar os 40% de prêmio de controle.
A CVM questiona a transparência da reunião, pedindo a divulgação formal da ata da reunião e exigindo a publicação dos votos dos conselheiros divergentes, algo que não aconteceu.
Além disso, de acordo com a revista eletrônica Consultor Jurídico, a entidade também busca entender por que o conselho de administração da BRF omitiu ao mercado que a votação terminou empatada, sendo somente desempatada pelo voto de minerva de Pedro Parente, decidindo pelo aumento de capital.
Outro ponto é que a discussão sobre um aumento de capital na BRF ocorre desde 2018, quando Pedro atual presidente do Conselho de Administração iniciou sua gestão, porém, a oferta curiosamente só vem ocorrer agora com a possibilidade clara de a Marfrig assumir seu controle acionário.
A Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobrás, vem sendo o único acionista relevante a se manifestar publicamente de forma contrária à operação, questionando as motivações que levaram à oferta, uma vez que obviamente a Marfrig possui interesse de mercado direto em relação à operação.
O que acaba sendo curioso é o porquê de os outros acionistas minoritários não terem se manifestado também de forma contrária visto que a oferta, além de diluir a participação dos minoritários, permite à quase certa tomada de controle por parte da Marfrig, sem o pagamento dos 40% de prêmio aos outros acionistas.
A Previ, fundo de previdência dos funcionários do Banco do Brasil, já havia no ano passado reduzido sua participação, à época, de 9% para 6%, no mesmo momento em que a Marfrig adquiriu cerca de 24% das ações da BRF, movimento que acarretou em um processo administrativo do Tribunal de Contas da União, buscando analisar a legalidade do negócio da Previ.
O tempo dirá se esse tipo de comportamento será punido ou estimulado. Para que aconteça a segunda coisa, basta que não aconteça nada. De certa forma, isso será um teste para a governança dos reguladores brasileiros.
Um abraço,
João Abdouni, CNPI
Nota do editor: essa não é uma recomendação de compra ou venda. Para acompanhar nossa Carteira, não deixe de conferir a série Ações Alpha.