Olá, leitor(a),
Mesmo que quisesse montar um ministério enxuto, com poucas Pastas, como fizeram Fernando Collor e Jair Bolsonaro, pelo menos no início de seus mandatos, Luiz Inácio Lula da Silva não conseguiria, tantos são os grupos políticos que precisa agradar para cumprir acordos e promessas de campanha.
Para piorar as coisas, os companheiros de partido, que ficaram no ostracismo (alguns, na cadeia) durante seis anos, se julgam merecedores dos melhores postos da Esplanada e do círculo íntimo do Planalto, estes mais conhecidos como ministros da Casa.
Cada petista que abocanha uma Pasta gorda, com boa dotação orçamentária e grande exposição popular, significa uma vaga a menos para as bocarras do Centrão, grupo parlamentar sem o qual não se aprova a liberação de verba para construção de um mata-burro no município de São João das Couves, curral eleitoral de uma das centenas de Suas Excelências.
Pô, e tem de desencavar um ministério para Simone Tebet, pessoa sem cujo apoio Lula poderia não ter derrotado Bolsonaro em 30 de outubro. E outro para Marina Silva, este ligado às causas mais gratas à defensora, mundialmente conhecida, do meio ambiente.
Fora isso, é preciso que haja forte presença feminina, multirracial, representantes da comunidade LGBTQIA +, índios (oopss, povos originais).
Se os ministros iniciais de Collor e Bolsonaro cabiam numa van, esses de Lula vão precisar de um BRT para comparecerem juntos a uma solenidade em palácio. Pois, se forem em seus respectivos carros oficiais, vão engarrafar a Praça dos Três Poderes.
Nos gabinetes dos anos 1950 e 1960, as pastas eram, por exemplo, Educação e Saúde, Viação e Obras Públicas, tudo aglutinado, tudo enxuto. Isso permitia que o presidente da República despachasse semanalmente com cada um de seus ministros, cujos nomes os brasileiros sabiam de cor.
Hoje em dia, a gente só conhece os onze do STF.
Mas vejamos como outros países tratam o problema.
Começando com nossos hermanos del sur, que por sinal amanhã poderão se tornar tricampeões mundiais de futebol, lá todos son peronistas, o que pelo menos facilita a montagem do Gabinete.
Se o sistema eleitoral americano é complicadíssimo, pelo menos a formação do Secretariado (forma deles denominarem o Ministério) é bastante simples.
Antes de mais nada, são apenas 15 Secretarias. Caso o eleito para a Casa Branca seja um democrata, ele escolhe seus secretários nos quadros do partido, abrangendo também os simpatizantes.
Na hipótese de uma vitória republicana, acontece a mesma coisa. O critério geralmente é a capacidade administrativa. Robert McNamara, por exemplo, que era presidente da Ford Motor Company, foi escolhido por John Kennedy para ser secretário de Defesa.
Dois detalhes importantes: Nos Estados Unidos, a maioria dos funcionários públicos é de carreira e os nomeados para as secretarias pouco mexem nos quadros administrativos.
Os Secretários têm de ter seus nomes aprovados pelo Senado. Portanto se há alguma acusação pendente contra ele, nem que seja a de ter contratado uma faxineira imigrante ilegal para trabalhar em sua casa, seu nome nem é submetido à Casa Alta do Capitólio.
No Reino Unido, dois partidos se alternam no nº 10 de Downing Street (residência oficial do primeiro-ministro): Conservador e Trabalhista. Há outros, mas possuem bancadas pequenas.
Como todos os ministros têm de ser membros do Parlamento (House of Commons), a escolha do Gabinete é feita através de negociações internas.
Se numa eleição geral (lá, o voto é distrital) a maioria das cadeiras vai para a oposição, todos os ministros são substituídos por parlamentares da bancada oposta.
Na França, o sistema eleitoral é engenhoso. Primeiro se vota para presidente, em dois turnos, numa eleição solteira.
Após o presidente ter sido escolhido e confirmado, é realizada a eleição para o Parlamento (Assembleia Nacional). Sendo assim, os eleitores já sabem se estão votando na situação ou na oposição.
Desde a República de Weimar (anos 1920), e com exceção da época do nazismo no poder (1933/1945), a Alemanha tem dezenas de partidos políticos.
O vencedor das eleições – a não ser que obtenha maioria absoluta, o que é bastante raro – precisa formar coalizões para poder governar. O processo só é facilitado por causa da obrigação de fidelidade partidária.
Poucos países democráticos têm um sistema eleitoral tão confuso quanto Israel. Prova disso é que nos quatro anos compreendidos entre 2019 e 2022 o país teve cinco eleições legislativas.
Para governar, o primeiro-ministro israelense é obrigado a fazer alianças com partidos tão díspares como o dos judeus ultraortodoxos e os socialistas. Isso acaba terminando em desentendimentos e o Parlamento (Knesset) é dissolvido.
O que realmente torna o Brasil mais complicado do que todos os países acima é a quantidade de ocupantes de cargos “de confiança” que mudam a cada troca de governo. São milhares deles.
Enquanto isso não for resolvido, e parece que ninguém em Brasília está interessado no assunto (muito antes, pelo contrário), não haverá transição sem os complicadores que estamos testemunhando no momento atual.
O presidente Washington Luís (1869/1957) dizia que “governar é abrir estradas”. Há muitos anos que o lema foi oficiosamente substituído por “governar é nomear desde um ministro de estado até o assessor do auxiliar do aspone.”
Antes de terminar, e só porque me lembrei do assunto neste momento, nos onze meses nos quais trabalhei numa empresa pública estadual, como diretor financeiro e administrativo, certa vez um funcionário, com um papelucho às mãos, me disse, na maior cara de pau, num final de quinta-feira:
“Doutor Ivan (é assim que eles me chamavam), o médico me prescreveu três dias de repouso: “sexta, segunda e terça.”
Um ótimo fim de semana para todos.
Ivan Sant’Anna