Gritty Investor #20 - O fim do Beatcoin

22 de setembro de 2017
A bolha estourou

Gritty Investor

Oi.
        
Na minha última newsletter anunciei meus planos de lançar uma nova criptomoeda, o Beatcoin.  Em função da “aparente” simplicidade da ancoragem de preço dada pelo Bitcoin e da possibilidade de multiplicação rápida do capital, desafiei meus leitores a apontarem falhas no meu plano. Testei meu business plan com minha equipe de análise e consegui, mesmo aqui, quebrar a barreira do pessimismo absoluto em relação a este investimento.

As respostas foram fundamentais para entender a atenção de muitos, e o dinheiro de alguns, sobre as criptomoedas. E a pesquisa só funcionaria se em algum momento eu deixasse vazar minhas dúvidas internas a respeito de algo desconhecido e, ao mesmo tempo, fascinante.
     
O mais importante era saber qual seria a resposta dos leitores a essa provocação. A experiência de escrever toda semana, apesar de assustadora a princípio, tem sido muito enriquecedora para mim em função do que eu recebo de volta na forma de depoimentos e questionamentos dos leitores.
     
Por isso, serei eternamente grato a você.  De forma geral, dá para destacar três tipos básicos de resposta à newsletter sobre o Beatcoin:
     
Os que confiam e querem investir: esse foi o maior grupo. Fico lisonjeado com a confiança de vocês, mas devo confessar minha absoluta incompetência e inexperiência sobre o tema. Usei truques psicológicos que aprendi com Dan Ariely, principalmente no livro Previsivelmente Irracional, aliado à confiança conquistada através de nosso contato semanal. Mesmo com todas essas carências técnicas ainda seria possível, mesmo que por um breve período, gerar “lucro” para alguns investidores, à custa de outros que eventualmente micariamcom uma moeda sem valor nenhum no futuro.
     
Os que, por conhecerem minha opinião sobre Bitcoin, entenderam a mensagem: se qualquer um pode criar uma moeda com um investimento inicial na casa de “milhões” e com a perspectiva de vender essa moeda por “bilhões”, encontramos uma vulnerabilidade dos que pregam uma valorização contínua das moedas, dado que elas têm uma quantidade de oferta limitada, ao contrário das moedas soberanas que são impressas pelos bancos centrais. Se essas moedas tem uma função de facilitar transações, elas têm que valer o “custo marginal” de construir outra moeda que exerça a mesma função. Acredito que o custo marginal seja maior do que os USD 10 milhões que coloquei em minha carta, mas deve ser muito menor que os USD 50 bilhões do valor atual do Bitcoin e do Ethereum.

Os que investem e ficaram chateados com minha ignorância e superficialidade sobre o assunto: a esses gostaria de me desculpar e, ao mesmo tempo, reconhecer tanto a ignorância quanto a superficialidade da proposta. Mas peço a vocês que reconheçam alguns pontos da minha experiência. Apesar de tudo, provavelmente eu conseguiria captar recursos com o Beatcoin. Como todo o risco viria de terceiros, eu só poderia arriscar meu tempo e minha reputação. Quem tem tempo de sobra e pouca reputação a arriscar, também conhecido como vigaristas de plantão, já deve ter enxergado essa oportunidade.
     
Fui informado por um leitor que já existiam mais de 800 criptomoedas sendo negociadas. Acredito que muitas dessas não passam de um golpe e não carregam os princípios quase filosóficos do movimento que criou o Bitcoin. Mas uma coisa me chamou a atenção. Muitos desses comentários traziam uma dose de raiva, de irritação profunda de alguém que foi contrariado por uma opinião leiga, mas, que talvez, faça sentido. Não pude deixar de me lembrar de uma cena do filme “Quem vai ficar com Mary” quando Ben Stiller dá carona a um estranho que revela a ele seu plano de negócios.
     
Agora que toda a experiência foi revelada, gostaria de tecer alguns comentários sobre cada um dos grupos acima.
         
Aos que acreditaram, peço que no futuro desconfiem de tudo e qualquer coisa que pareça milagroso demais. Milagres financeiros não existem e geralmente não batem à porta. E raramente milagres financeiros são anunciados na mídia. Não tenham preconceito contra ideias novas, nem contra os que acreditam na revolução da criptomoeda. Eles investem na ideia que estão vendendo, têm Skin on the Game e eventualmente podem ter razão. Mas se você não entende do assunto, não arrisque seu suado dinheiro em algo que você não vai se perdoar se der errado.
      
Aos que entenderam a mensagem de que se algo pode ser criado tão facilmente não pode ser muito valioso, eu te dou meus parabéns. Vocês estão no caminho certo de ser um investidor inteligente.
     
Aos que não leram meu conto do aliche, deixo aqui a mensagem final. Se acontecesse uma chuva de meteoros de ouro, que tornasse esse metal abundante na terra, ninguém ficaria rico por deter ouro. E os detentores atuais de ouro veriam seu patrimônio desaparecer. Quando escrevi esse conto existiam pouco mais de 50 moedas negociadas. Já estamos ultrapassando as 800 e, em um ano, com certeza estaremos falando de milhares.
     
As autoridades chinesas já reconheceram esse fenômeno e estão no caminho de barrar a criação, a negociação e provavelmente a utilização do Bitcoin na China. As outras autoridades globais, como na maioria das vezes, vão chegar atrasadas. Isso provavelmente vai acontecer quando as primeiras fraudes começarem a ser reveladas ou quando o sigilo de transações com essas moedas ameaçar a segurança nacional, facilitar a lavagem de dinheiro e a evasão de impostos.
        
Nessa hora, o que foi criado vai ser substituído e os benefícios do Blockchain vão ser usados pelos legítimos emissores de moedas: as nações soberanas.

Conheça o responsável por esta edição:

Pedro Cerize

Gestor de fundos de investimentos e autor da série A Carta

Sócio-fundador da Inv e da Skopos Investimentos, Pedro Cerize é considerado um dos melhores gestores de renda variável do Brasil. Em sua série “A Carta”, analisa a economia brasileira e sugere alocações de investimentos. Também é autor da newsletter "Gritty Investor" e está à frente da série "1+100 Reloaded", além de participar da "Top Pix".

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