Caro(a) leitor(a),
Uma coisa é certa e acho que ninguém pode discordar de mim. No mercado de ações, estamos atravessando um bear market global.
Além de comentá-lo neste texto, vou fazer um apanhado de alguns relevantes que o precederam, com destaque para seus fundamentos e sua duração. Me limitarei à B3 e à Wall Street.
De 4 de abril deste ano até o momento em que redijo estas linhas, o Ibovespa caiu treze e meio por cento, consequência da fuga para títulos de renda fixa de investidores em ações. O motivo é um só. A taxa Selic, fixada pelo COPOM, subiu de 2% para os atuais 12,75%, sendo que deverá subir um pouco mais nas próximas reuniões do colegiado do BC.
O bear market tupiniquim anterior ocorreu no segundo semestre do ano passado, mais precisamente de 15 de junho a 25 de novembro. Nesse período, o Ibovespa levou um tombo de 18,66%, causado pelo encolhimento da economia resultante do surto de Covid.
Passemos aos Estados Unidos, onde a queda das Bolsas veio para arrebentar.
Tendo feito uma máxima de todos os tempos no dia 4 de janeiro deste ano, o índice industrial Dow Jones caiu 14% até agora. A situação do S&P500 foi ainda pior (para os touros, é claro). Praticamente no mesmo período, perdeu 18,36% de seu valor. Finalmente temos o Nasdaq. Assim como foi o que mais cresceu na época das vacas gordas, o índice composto principalmente de empresas de tecnologia, literalmente despencou de 16.000 para 11.150, uma queda de 30%.
Três fatores foram os responsáveis por esse bear market americano:
- Inflação decorrente da monetização dos cidadãos com doações em dinheiro, provocando inclusive uma alta no custo da mão de obra semiqualificada (trabalhadores e entregadores de cadeias de fast food, etc.)
- Demora do FOMC — Federal Open Market Committee (Comitê Federal de Mercado Aberto) — em agir preventivamente para evitar um surto inflacionário, que acabou se revelando o maior das últimas quatro décadas: 8,5% a.a. em março de 2022.
− Diminuição da produção industrial causada pela falta de insumos.
Regredindo ainda mais no tempo, e voltando a falar sobre o Ibovespa, tombaço mesmo ocorreu quando do surgimento da Covid-19 na China e sua irradiação pelo mundo, inclusive chegando ao Brasil. Esse bear market foi tão violento quanto fugaz. Em pouco menos de três meses, entre 6 de janeiro e 30 de março de 2020, o índice de ações da B3 caiu 40%.
Lá fora, no mesmo período, e com intensidade parecida, o Industrial Dow Jones desabou 34%, o S&P 500, 32% e o Nasdaq, 28%.
Todos esses bear markets mostrados acima tiveram como consequência o surto de Covid, a inflação decorrente da pandemia e, por fim, a guerra russo-ucraniana.
Os ciclos anteriores do urso foram causados por fatores totalmente distintos.
O principal deles foi a crise do subprime. Melhor explicitando: uma bolha no mercado de hipotecas que resultou numa quase quebradeira de instituições financeiras nos Estados Unidos.
Esse “quase” ficou por conta do governo americano que salvou grandes empresas, como a General Motors, por exemplo, da falência, emprestando dinheiro à montadora de Detroit, tendo como garantia ações da própria companhia.
As duas maiores sociedades de crédito imobiliário, Fannie Mae e Freddie Mac, foram socorridas pelo Tesouro para não quebrarem. Quem não escapou foi o banco Lehman Brothers, que foi à falência.
Durante essa crise do subprime, que durou aproximadamente dois anos, no final da década de 2000, o Dow Jones caiu 45%, o S&P500, 43% e o Nasdaq quase 50%. Na época, o então presidente Lula disse que, se a crise chegasse ao Brasil, seria apenas uma marolinha.
Não foi propriamente assim: o Ibovespa se desvalorizou em 45%, o mesmo percentual de seus congêneres americanos, sem que houvesse nenhuma crise imobiliária por estas bandas.
De 1994 para trás, não adianta procurar bear markets no Brasil. O país era urso permanente. Vivíamos a hiperinflação e qualquer mês em que as bolsas de São Paulo e do Rio ficassem estáveis era uma perda colossal.
O negócio aqui era especular com ações da então Cia. Vale do Rio Doce (atual Vale) e da Petrobrás (atual Petrobras).
Pesquisando o passado das bolsas americanas, não é tão fácil encontrar bear markets. Anterior ao do subprime, o mais próximo é o decorrente dos ataques de 11 de setembro de 2001.
Só que ali foi uma coisa diferente, na qual corretoras, como a Cantor Fitzgerald, que ocupava cinco andares no alto da torre sul do World Trade Center e perdeu quase todo o seu corpo de funcionários, foram literalmente destruídas.
Retrocedendo até 1929 e a Grande Depressão dos Anos Trinta, não é tão fácil encontrar bear markets.
Isso é animador.
Pode-se perceber que eles são raros e não duram para sempre. Muito pelo contrário. Costumam representar excelentes oportunidades de compra de ações.
Um ótimo fim de semana para todos.
Ivan Sant’Anna