Mercadores da Noite #273: O mundo não será mais o mesmo

23 de abril de 2022
Mesmo que Vladimir Putin seja deposto e que os exércitos russos se retirem da Ucrânia, o mal está feito. Estamos regressando à primeira metade do século 20, quando qualquer coisa era motivo para guerra.

Caro(a) leitor(a),

 

A última guerra de agressão e conquista ocorrida na Europa tinha sido a invasão da Polônia pelas tropas de Adolf Hitler em 1º de setembro de 1939.

Antes, os nazistas haviam incorporado a Áustria, através do Anschluss, mas Hitler (austríaco de nascimento) foi recebido em triunfo pela maior parte de seus compatriotas. A invasão da Tchecoslováquia, em março de 1938, também se deu sem derramamento de sangue.

Em outros continentes, o Japão, querendo expandir seu império, carente de commodities, invadiu a Coreia, a Manchúria e grande parte do território chinês. O ataque a Pearl Harbor não chegou a ser uma guerra de conquista (por sinal, os japoneses nem tentaram ocupar o Havaí), mas uma tentativa (fracassada, no meu entender) de aniquilar a esquadra americana do Pacífico.

A falha ocorreu porque os bombardeiros japoneses não encontraram nenhum porta-aviões americano ancorado em Pearl Harbor. Estavam todos ao largo naquela manhã ensolarada de domingo, 7 de dezembro de 1941.

Durante a Segunda Guerra, o Império do Sol Nascente ocupou Guam, ilhas Wake, Hong Kong, Filipinas, Indonésia, Malásia, Singapura, Burma (atual Mianmar) e Indochina (atual Vietnã).

Entre Hiroshima/Nagasaki e os dias de hoje, os países abandonaram a prática de guerras de conquista. A exceção fica por conta da tomada da Crimeia, em março de 2014, pelas tropas russas de Vladimir Putin, e agora pela agressão à Ucrânia.

Não vai sair barato. E não me refiro apenas aos russos e ucranianos. Não vai sair barato para o mundo.

Após a derrota completa da Alemanha, em 1945, quando no país não restou praticamente pedra sobre pedra, o regime democrático implantado no lado oeste (Alemanha Ocidental) optou por não ter Exército, a não ser para ações internas de defesa e manutenção da ordem pública.

No início desta guerra russo-ucraniana, a Alemanha (unificada desde 1990) restringiu-se a mandar capacetes para o exército da Ucrânia. Só que, ao testemunhar o massacre russo, o governo alemão rompeu uma prática de quase 80 anos e está enviando armas e munições para ajudar os ucranianos a se defender. Entre esses armamentos, sofisticados mísseis antitanques e antiaéreos.

Com certeza, os alemães não vão se limitar a ajudas externas. Tratarão de se defender de um Lebensraum (espaço vital de Adolf Hitler, o que significava expansão para o leste) às avessas, que poderia ser perpetrado pelos russos, passando pela Ucrânia e Polônia.

Como se pode deduzir, dispondo de enorme avanço tecnológico em quase todas as áreas, a Alemanha não precisará de muito tempo para erigir um arsenal de armas de dissuasão (no popular, ogivas nucleares) e de mísseis capazes de lançá-las com precisão na praça Vermelha, em Moscou.

Do outro lado do mundo, o Japão está se deparando com preocupações semelhantes.

Após a rendição, em 2 de setembro de 1945, para os americanos, a bordo do encouraçado Missouri, ancorado na baía de Tóquio, os japoneses adotaram uma política pacifista incluída na constituição ditada pelo general Douglas MacArthur, comandante supremo das tropas de ocupação do arquipélago nipônico.

De lá para cá, os japoneses conviveram bem com essa legislação, e com esse sentimento não beligerante.

Tanto é assim que mesmo quando foram formadas grandes coalizões militares, como a da primeira guerra do Golfo, que reuniu 39 países, incluindo nações díspares como Afeganistão e Noruega, o Japão ficou de fora. Limitou-se a enviar médicos, paramédicos, medicamentos e um navio-hospital. 

Agora essa tendência pacifista está mudando. Temendo uma China militarmente expansionista e uma Coreia do Norte dirigida por um tirano louco, três entre cada quatro japoneses querem mudar esse status quo, alterando a legislação antimilitarista.

Tal como acontece com a Alemanha, o Japão não teria de enfrentar nenhum desafio tecnológico para iniciar um programa armamentista nuclear.

Mesmo que Vladimir Putin seja deposto e que os exércitos russos se retirem da Ucrânia, o mal está feito. Estamos regressando à primeira metade do século 20, quando qualquer coisa era motivo para guerra.

Em minha opinião, para quem opera no mercado financeiro, é esse cenário que deve ser levado em conta.

Embora seja quase impossível uma guerra atômica mundial (o planeta, principalmente o Hemisfério Norte, regressaria à idade da pedra lascada), essa corrida armamentista vai provocar o crescimento da indústria bélica, e da cotação dos insumos que a abastecem, muitos deles oriundos do Brasil.

Um ótimo fim de semana para todos.

 

Ivan Sant’Anna
 

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Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

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