Para que não aconteça de novo
Por Ivan Sant´Anna e Rodrigo Natali
Eu estava no escritório da Inversa em São Paulo na sexta-feira, dia 5, quando alguém disse que um bimotor King Air, que levava a artista Marília Mendonça, havia caído em Minas. Falou também que todos a bordo haviam sobrevivido.
É que o avião, visto de cima, parecia intacto. Só quando a equipe de resgate chegou ao local da queda é que viu que a fuselagem estava totalmente esmagada e os ocupantes, mortos.
Nas horas e dias que se seguiram, diversas emissoras de rádio e televisão me pediram para dar entrevistas dando minha opinião sobre o assunto. Recusei todos os convites porque acho que seriam apenas palpites que poderiam estar certos ou errados.
O motivo desse assédio é que, além de ter sido piloto durante várias décadas, já escrevi quatro livros sobre tragédias aéreas, sendo três deles best-sellers.
Os relatórios do Cenipa – Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos – não tem como objetivo apontar culpados, mas sim entender o que deu errado e evitar que uma nova tragédia se repita.
Traçando um paralelo com o nosso mundo político-econômico, quando ainda durante o governo Michel Temer, com Henrique Meirelles à frente do ministério da fazenda, promulgou-se a Emenda Constitucional do Teto de Gastos Públicos, foi justamente para evitar que uma forte turbulência fiscal, como a ocorrida em 2014 durante o governo Dilma Rousseff, se repetisse.
O PIB havia mergulhado da forma mais drástica já gravada na história recente e custou o mandato da nossa pilota. Tirou-se a lição de que algum dispositivo poderia ser criado para evitar que isso acontecesse de novo.
E quando o novo governo assumiu o poder, nosso Ministro da Economia, repetia sempre a força de tal mecanismo e a importância para o longo prazo do Brasil.
Aí veio a pandemia e, por causa de um afobo do presidente, que ao ouvir o Ministro Osmar Serra, declarou que o novo vírus era apenas uma “gripezinha”,começou a se desenhar um novo acidente.
As coisas foram se agravando com outros inúmeros erros de condução por parte de diversos políticos diferentes, e parecia que o acontecido em 2014 estava no horizonte. A sequência de erros que geralmente resulta em tragédias continuou, mas desta vez, por mais que tudo parecesse fadado ao fracasso, o mecanismo do teto de gastos foi dobrado, mas não quebrou.
Enquanto muitas pessoas insistem em olhar apenas o que vai piorar para o ano que vem com a aprovação da PEC do Precatórios, que não é muito (deterioração da relação dívida/Pib da ordem de 0,4%), elas ignoram o cenário de futuro que o Teto ainda tem a capacidade de gerar, ainda mais num cenário onde o Brasil poderia crescer de forma mais robusta.
Nele, nossa dívida PIB voltaria a entrar numa trajetória de queda, nos diferenciando da maioria dos países do mundo. Nesse cenário, voltamos a ser destino de fluxos de investimentos, dignos de upgrades de agências de risco.
Assim, o avião de nossa economia pode seguir voando com alguma visibilidade no horizonte. Tudo isso porque o Teto de Gastos ainda está lá e precisaria de outra PEC no futuro para mudá-lo de novo, o que, por mais que hoje pareça, não é algo trivial.