O patriota que veio de fora
Por Ivan Sant'Anna e José Inácio Pilar
Num momento em que o espírito de melancolia toma conta de boa parte dos brasileiros, foi preciso que um estrangeiro chegasse aqui, se enrolasse na bandeira do Brasil, para ressuscitar algo há muito esquecido.
Claro que estou me referindo à vitória de Lewis Hamilton no Grand Prix de Fórmula 1 ocorrido em São Paulo no último fim de semana.
Uma coisa já era certa: Hamilton perderia cinco posições no grid de largada por conta de uma troca de motor em seu carro.
Como se não bastasse, uma diferença de um milímetro na altura da asa traseira do seu Mercedes, por sinal dedurada pelo “inimigo” e líder do campeonato Max Verstappen, fez com que o inglês largasse em último na sprint race de sábado, na qual chegou em quinto lugar, depois de passar 15 adversários em 24 voltas.
Quinto na sprint, cinco posições perdidas por conta do motor substituído, Hamilton largou em décimo na corrida principal do domingo, contra o segundo de Verstappen, que logo na primeira curva já assumiu a liderança.
Numa corrida espetacular, Lewis ganhou posições uma a uma e venceu a corrida para delírio de seus compatriotas presentes ao autódromo e aos que assistiam a corrida pela televisão.
“Mas como compatriotas?”, pode estar indagando o leitor, se o cara é inglês.
É que, tal como Ayrton Senna em 1991, quando venceu a corrida de Interlagos dispondo apenas da sexta marcha nas últimas voltas, Lewis Hamilton, fã declarado do tricampeão já falecido, despertou uma brasilidade adormecida nestas terras.
Ironicamente, essa vitória em nossa terra foi a sua de número 101, mesmo número de vitórias de todos os pilotos brasileiros na categoria somados: Senna (41), Piquet (23), Fittipaldi (14), Barrichello (11), Massa (11) e Pace (1).
Vê-lo na volta da vitória e no pódio entrelaçado com a bandeira verde amarela, num claro gesto de simpatia com a torcida local e homenagem ao seu ídolo, ressuscitou, pelo menos por algumas horas, a sensação de que o Brasil também tem qualidades e até heróis, mesmo que neste interregno de otimismo tenhamos de importá-lo de fora.
Como disse o narrador Sérgio Maurício, da Rede Band, logo após a corrida, além do troféu Lewis Hamilton deveria ter recebido um passaporte brasileiro.
Estaria em ótimas mãos.