Já dizia Tom Jobim
Por Ivan Sant'Anna e Rodrigo Natali
Na segunda-feira, 19 de outubro de 1987, a Bolsa de Valores de Nova York sofreu a maior queda, em um único pregão, de todos os tempos, superando a da Black Tuesday de outubro de 1929. Nesse segundo tombo, o S&P500 perdeu 20 por cento de seu valor.
Talvez porque tenha se dado mal no crash, talvez porque o mercado experimentou rápida recuperação, o certo é que um artista ítalo-americano, Arturo di Modica, ao custo de 300 mil dólares (US$ 670 mil em valores de hoje), esculpiu um touro de bronze, em posição de ataque (The charging bull).
Sem pedir autorização à prefeitura, Modica providenciou caminhão e guindaste. Sua magnífica instalação foi instalada (com minhas desculpas pela redundância) bem em frente ao prédio da New York Stock Exchange. Isso aconteceu na madrugada de quinta-feira, 14 de dezembro de 1989.
Como seria de esperar, as autoridades municipais não concordaram com a exposição rebelde e mandaram remover o touro para um pátio da prefeitura.
O que elas não esperavam era que uma multidão seguisse o caminhão-guincho em protesto contra a retirada do símbolo que, literalmente da noite para o dia, caíra no gosto dos nova-iorquinos.
Não houve jeito. As queixas foram se avolumando e o prefeito Ed Koch não teve outra opção a não ser a de indultar o touro proibido e devolvê-lo para a região de Wall Street, agora em Bowling Green, onde a estátua se tornou um símbolo da cidade.
Em São Paulo, as coisas aconteceram de modo oposto. Uma vaca amarela foi encomendada por uma empresa privada como uma peça de marketing e chancelada pela B3 e pela prefeitura. A população a recebeu mal, tornando-se alvo de protestos e vandalismo desde o dia em que lá chegou.
E teve o final oposto ao da estátua de Nova York; foi retirada com aplausos.
Talvez, não estejamos prontos para comemorar nosso mercado de capitais. Pode ser que ainda tenhamos complexo de cão vira-lata.
“Uma afronta aos que passam fome”; “tripúdio das elites”, foi o mínimo que se falou e escreveu do touro tupiniquim.
Já dizia Tom Jobim: “Sucesso, no Brasil, é a pior das ofensas pessoais”.
Se tivessem posto a estátua de um jegue esquálido, talvez fosse celebrado pelos “movimentos sociais.”
Mas, talvez, arte e símbolos verdadeiros não podem ser decididos numa sala, como forma velada de marketing. Ainda mais tentando copiar algo que já é tão icônico de forma tão preguiçosa e objetivamente de qualidade inferior.
Só espero que algum empresário mais esperto mande fabricar milhares de miniaturas do touro dourado para vendê-la no varejo. Faço questão de ser um dos primeiros a comprá-la e de pô-la em minha mesa de trabalho e reproduzi-la em minha página no Facebook.
A estátua já fez história. E história não pode ser anulada. Aconteceu, e pronto.