Já dizia Tom Jobim

24 de novembro de 2021
Um touro dourado que a B3 colocou em frente ao seu prédio foi alvo de protestos, e de vandalismo, desde o dia em que lá chegou. E já partiu.

Já dizia Tom Jobim

Por Ivan Sant'Anna e Rodrigo Natali

 

Na segunda-feira, 19 de outubro de 1987, a Bolsa de Valores de Nova York sofreu a maior queda, em um único pregão, de todos os tempos, superando a da Black Tuesday de outubro de 1929. Nesse segundo tombo, o S&P500 perdeu 20 por cento de seu valor.

Talvez porque tenha se dado mal no crash, talvez porque o mercado experimentou rápida recuperação, o certo é que um artista ítalo-americano, Arturo di Modica, ao custo de 300 mil dólares (US$ 670 mil em valores de hoje), esculpiu um touro de bronze, em posição de ataque (The charging bull).

Sem pedir autorização à prefeitura, Modica providenciou caminhão e guindaste. Sua magnífica instalação foi instalada (com minhas desculpas pela redundância) bem em frente ao prédio da New York Stock Exchange. Isso aconteceu na madrugada de quinta-feira, 14 de dezembro de 1989.

Como seria de esperar, as autoridades municipais não concordaram com a exposição rebelde e mandaram remover o touro para um pátio da prefeitura.

O que elas não esperavam era que uma multidão seguisse o caminhão-guincho em protesto contra a retirada do símbolo que, literalmente da noite para o dia, caíra no gosto dos nova-iorquinos.

Não houve jeito. As queixas foram se avolumando e o prefeito Ed Koch não teve outra opção a não ser a de indultar o touro proibido e devolvê-lo para a região de Wall Street, agora em Bowling Green, onde a estátua se tornou um símbolo da cidade.

Em São Paulo, as coisas aconteceram de modo oposto. Uma vaca amarela foi encomendada por uma empresa privada como uma peça de marketing e chancelada pela B3 e pela prefeitura. A população a recebeu mal, tornando-se alvo de protestos e vandalismo desde o dia em que lá chegou.

E teve o final oposto ao da estátua de Nova York; foi retirada com aplausos. 

Talvez, não estejamos prontos para comemorar nosso mercado de capitais. Pode ser que ainda tenhamos complexo de cão vira-lata. 

“Uma afronta aos que passam fome”; “tripúdio das elites”, foi o mínimo que se falou e escreveu do touro tupiniquim.

Já dizia Tom Jobim: “Sucesso, no Brasil, é a pior das ofensas pessoais”.

Se tivessem posto a estátua de um jegue esquálido, talvez fosse celebrado pelos “movimentos sociais.”

Mas, talvez, arte e símbolos verdadeiros não podem ser decididos numa sala, como forma velada de marketing. Ainda mais tentando copiar algo que já é tão icônico de forma tão preguiçosa e objetivamente de qualidade inferior.

Só espero que algum empresário mais esperto mande fabricar milhares de miniaturas do touro dourado para vendê-la no varejo. Faço questão de ser um dos primeiros a comprá-la e de pô-la em minha mesa de trabalho e reproduzi-la em minha página no Facebook.

A estátua já fez história. E história não pode ser anulada. Aconteceu, e pronto.

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Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

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Rodrigo Natali

Estrategista-Chefe

Rodrigo Natali tem graduação e MBA pela FGV. É especialista em câmbio e macroeconomia, tem 25 anos de experiência no mercado financeiro, tendo passado por diversas instituições nacionais e internacionais onde exerceu a profissão de trader e gestor de fundos de investimento multimercado.

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