Gritty Investor #73 - O livro da minha vida – parte 2

17 de julho de 2020
Vou compartilhar com você agora ensinamentos valiosos de Warren Buffett para ajudar na avaliação assertiva das empresas.

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Nota do editor: nas próximas linhas, Pedro Cerize vai compartilhar como o jeito Buffett é único para avaliar os melhores investimentos.
Com dividendos, é possível você multiplicar seu patrimônio de forma consistente ao longo dos anos. A bola de neve vai jogar a seu favor: veja aqui.

Oi.

Na Gritty passada exploramos o primeiro de quatro aspectos principais utilizados por Warren Buffett na hora de escolher ações: a análise do negócio. Eu disse que um bom negócio deve ser de fácil entendimento (pelo menos para você), ter um histórico longo e consistente de resultados operacionais favoráveis e perspectivas propícias no longo prazo. Essa é a definição de AAA, bom no passado, no presente e no futuro.

Hoje, vou dar continuidade ao assunto falando sobre os outros aspectos utilizados por Buffett. Você vai ver que este texto será um pouco mais árido para leitura. Mas garanto: é muito menos complexo que um tratado de medicina. Qualquer um pode entender e aplicar.

Análise da Gestão

Para fazer essa análise, você deve pensar nas perguntas abaixo a respeito da gestão da empresa em que você pretende investir.

A gestão é racional? Competência de gestão não significa automaticamente racionalidade. Muitos projetos são bem tocados e mesmo assim geram retornos baixos. O gestor racional entende que o papel dele, além de gerir eficientemente o negócio, é alocar de maneira racional o capital dos acionistas. E o que não pode ser investido a taxas altas deve ser devolvido na forma de dividendos.

A gestão é transparente com os acionistas? A tendência natural do ser humano é tentar esconder as coisas ruins e alardear as coisas boas. Buffett prefere aqueles que são transparentes principalmente com o que deu errado. Isso evita surpresas negativas e, paradoxalmente, aumenta a confiança do dono no executivo. E o dono também deve fazer sua parte e entender que erros são normais. Rigor excessivo com os erros inibe o empreendedorismo e torna tentador, para o executivo, esconder os problemas que aconteceram. Atenha-se ao conjunto da obra e receba com naturalidade o relatório de falhas e medidas para amenizá-las. Desconfie de quem nunca errou: ou ele não faz nada, ou mente.

A gestão é capaz de resistir ao “Imperativo Institucional”? Esse é um aspecto muito pouco entendido e, ao mesmo tempo, fundamental na análise da gestão. Frequentemente, vemos algumas “modas”, tendências que invariavelmente atraem as boas empresas para armadilhas que muitas vezes destroem muito dinheiro dos acionistas. Podemos ver ciclos de terceirização seguidos de verticalização. Pagamentos de dividendos à custa de aumento de endividamento, seguidos de períodos de “deleverage” (desalavancagem).

Mas o principal, sem dúvida nenhuma, são as aquisições. Na maioria das vezes, em um processo de aquisição, grande parte dos benefícios é monetizada pelo vendedor. Aos compradores, sobram o trabalho de ganho de sinergia, o risco inerente ao negócio e uma dívida para pagar. Mas, para o executivo da empresa compradora, toda aquisição é uma “vitória”, uma conquista de poder. Resistir ao imperativo institucional representa, antes de tudo, não ceder à pressão (imperativo) do sistema para tomar medidas que vão contra o interesse do acionista no longo prazo.

Análise Financeira

Seguiremos agora para a análise financeira. Você precisa saber, desde já, que estou falando de uma análise um pouco peculiar. Fuja dos padrões de análise de múltiplo, de ciclos financeiros e indicadores tradicionais de análise de balanços.

Foque no retorno sobre o patrimônio, não no lucro por ação. Muitas companhias têm como meta o crescimento do lucro por ação no longo prazo. Assumindo que o múltiplo permaneça mais ou menos constante: a lógica indica que quanto mais o lucro por ação subir, mais subirá o preço da ação. Mas isso pode esconder alguns truques que distorcem essa análise. 

Suponha que existam dois negócios. Um excelente, com retorno de 30 por cento ao ano negociando a 20x o lucro. Outro com retorno de 10 por cento ao ano negociando a 10x o lucro.

Se o primeiro negócio compra o segundo, pagando em ações, seu lucro por ação vai subir com a operação (emite ações a 20x para comprar lucros a 10x). Mas o resultado da fusão será uma empresa com retorno entre 10 por cento e 30 por cento. Como no longo prazo o resultado converge para o retorno sobre o patrimônio, apesar da aceleração do lucro por ação, o retorno vai cair.

Calcule o lucro do dono ao investir. Muitas empresas detêm ativos ou participações em outras empresas que geram lucro que não passam pelo resultado. Foque no resultado do negócio como um todo.

Procure negócios com margens elevadas. Se temos 2 negócios ganhando o mesmo lucro, mas um com uma margem de 50 por cento e outro com uma margem de 2 por cento, escolha o primeiro. Numa eventual piora das condições do mercado, o primeiro pode ver sua margem cair para 40 por cento e ainda se manter lucrativo, enquanto o outro pode entrar rapidamente no prejuízo, muitas vezes de maneira irremediável.

Tenha certeza de que, para cada real retido na companhia, ela gere ao menos um real de valor de mercado. Isso é consequência de tudo o que foi dito até aqui. Se o mercado confia que a empresa mantém com ela o capital remunerando bem, todo resultado retido se valoriza em proporção igual, ou superior, no mercado. Essa análise, porém, só pode ser feita em períodos longos de tempo em que as oscilações do dia a dia perdem a relevância.

Análise do Valor de Mercado

Este é o ponto em que a maioria das pessoas gasta a maior parte do tempo, tentando calcular o valor justo de um negócio e comparando com o valor de mercado.

Primeiro avalia-se o valor justo do negócio. Isso é feito a partir de métricas simples e relativamente estáveis. Se temos um negócio estável operacionalmente, com gestão racional e honesta, com margens e retorno sobre patrimônio elevados, podemos estimar com razoável precisão uma faixa de valor para a empresa.

Depois vem a pergunta: é possível comprar o negócio, com um desconto suficientemente alto, que dê uma margem de segurança ao comprador, em caso de erro na avaliação do seu valor? Pois saiba que um negócio perfeito, precificado como tal, não gera oportunidades de lucro.

Aqui, duas coisas podem ser perigosas: achar que uma ação está barata demais ou que uma empresa é boa demais para não fazer parte da sua carteira. Escolha sempre uma empresa muito boa, mesmo que razoavelmente precificada. Melhor isso do que uma empresa razoável precificada no que parece ser barato demais.

Esses princípios influenciaram meu estilo de investir. Nem todos os meus ganhos seguiram essa cartilha, mas todos os meus grandes erros estavam fora dela. E para compor o seu dinheiro, errar pouco faz toda diferença.

Um abraço,

Pedro Cerize

Conheça o responsável por esta edição:

Pedro Cerize

Gestor de fundos de investimentos e autor da série A Carta

Sócio-fundador da Inv e da Skopos Investimentos, Pedro Cerize é considerado um dos melhores gestores de renda variável do Brasil. Em sua série “A Carta”, analisa a economia brasileira e sugere alocações de investimentos. Também é autor da newsletter "Gritty Investor" e está à frente da série "1+100 Reloaded", além de participar da "Top Pix".

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