Mercadores da Noite #295: Revolução na Terra do Rei

24 de setembro de 2022
Antes, um corte de carga horária era considerado perda para os patrões e ganho para os empregados. Até que se descobriu que não é nada disso. Todos ganham.

Olá, leitor(a),

 

Em minha época de adolescente, a semana de trabalho era de seis dias. Funcionários públicos, bancários, professores, industriários, estudantes, quase todas as classes exerciam suas atividades aos sábados, a maioria até o meio-dia. As empregadas domésticas só tinham folga nas tardes de domingo, após servirem o almoço dos patrões, retornando na manhã de segunda-feira.

Então surgiu o que veio a ser chamado de semana inglesa. A maioria das pessoas passou a trabalhar cinco dias em cada sete, regime que prevalece até hoje, com algumas exceções. Comerciários e empregados em bares e restaurantes, por exemplo, continuam folgando apenas uma vez por semana.

Minha filha é executiva de uma cadeia de supermercados da Inglaterra. Há alguns meses, a empresa na qual ela trabalha resolveu testar a semana de quatro dias úteis e três de folga.

A experiência deu tão certo (a produtividade e a produção – são coisas diferentes – subiram), que eles resolveram torná-la permanente.

Uma matéria divulgada pela BBC News esta semana revelou que mais de 70 empresas inglesas aderiram à novidade. Cem por cento de pagamento contra oitenta por cento de horas trabalhadas.

Eu tenho a mais profunda convicção de que isso é apenas o início de uma etapa no modo de viver das pessoas, etapa essa que se espalhará pelo mundo, sem retrocesso.

Acho até bem plausível que daqui a 50 ou 100 anos haverá outra mudança: quatro dias de folga contra três de trabalho, já que robôs responderão por boa parte da produção de bens e serviços.

Coisas como ônibus, aviões e trens não tripulados, assim como máquinas semeadoras e colheitadeiras no campo, dispensarão o uso de condutores.
 

* * *
 

Entre o século 11 e a segunda metade do século 17, prevaleceu nas áreas rurais da Rússia czarista o regime de servidão, avanço muito pequeno em relação à escravidão propriamente dita.

Em troca de um minúsculo pedaço de terra, para plantar alguma coisa para o sustento da família, os servos trabalhavam de sol a sol sete dias por semana. Podiam ser chicoteados e até enforcados pelos senhores de terra, sem necessidade de explicar o motivo do castigo.

Na Inglaterra, no início do século XIX, os mineiros de carvão começavam seu turno de trabalho antes do nascer do sol e terminavam após o início da noite. Tiravam um dia de folga a cada dez. Moravam com a toda a família em casas de um só cômodo, das quais eram despejados quando perdiam o emprego.

Meninos de até quatro anos eram usados nos trabalhos das minas porque podiam rastejar através de túneis estreitos.

A expectativa de vida desses mineiros ingleses era de 32/33 anos.

Nos Estados Unidos, houve a primeira greve para redução da jornada de trabalho. Empregados em fazendas pleitearam passar de 12 para 10 horas.

Ao longo das décadas e dos séculos, as coisas foram melhorando até o estágio atual.

Só que, antes, um corte de carga horária era considerado perda para os patrões e ganho para os empregados. Até que se descobriu que não é nada disso. Todos ganham.

Se a jornada de 4 dias de trabalho se espalhar pelo mundo, haverá grande diminuição nos níveis de desemprego, já que nas fábricas, na construção civil, nas indústrias, no comércio e no setor de serviços haverá um aumento de turnos de empregados.

Os governos pagarão menos seguro desemprego.

Algumas indústrias, como a de turismo e lazer, serão extremamente beneficiadas por essa mudança. O mesmo ocorrerá com as companhias aéreas e de locação de carros.

Quem costuma pensar em investimentos a longo prazo, deve prestar bastante atenção ao que irá acontecer no Reino Unido nos próximos anos.

Se a revolução ora em curso na Terra do Rei der certo, ela logo se espalhará pelo mundo.

Um ótimo fim de semana para todos.

Ivan Sant’Anna

Nota do Editor: Além de assinar a Mercadores da Noite, que sai aos sábados aqui e em podcast nas plataformas Spotify e Deezer etc., Ivan Sant'Anna também escreve todas as segundas, terças e quintas-feiras a coluna Warm Up PRO, que você pode conhecer clicando aqui!

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Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

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