Os destaques da ata da reunião do Banco Central americano

7 de abril de 2022
Após a divulgação da ata do Fed, tivemos uma reação muito incomum do mercado, algo que normalmente não ocorre depois de reuniões do BC americano. Neste Relatório, Rodrigo Natali analisa esse movimento.

Ontem à tarde, o Banco Central americano (Fed) publicou a ata da sua reunião do dia 16 de março. Como é tradicional, os analistas e participantes do mercado global se debruçaram sobre o documento em busca de pistas do plano do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC) para os próximos ajustes de política monetária que estão em andamento.

Depois de meses sendo expansionistas, em uma intensidade nunca vista antes na história, o time liderado por Jerome Powell mudou sua postura de forma rápida e intensa, indo em direção a menos estímulos e começando, nesta reunião, oficialmente, a alta de juros com o objetivo fundamental de controlar a inflação que roda em patamares não vistos desde o início da década de 80.

De forma geral, o tom foi mais restritivo e preocupado com o cenário futuro, dando a entender que talvez teriam começado o ciclo de altas de forma mais agressiva se não fosse a novidade do conflito na Ucrânia, que tinha acabado de começar e cujas consequências eram bem desconhecidas e que poderiam trazer novos riscos à estabilidade financeira do mundo.

Outra novidade foi o progresso no desenho do plano de como o Fed vai reduzir seu balanço composto por títulos públicos e privados comprados desde a pandemia: vão deixar o estoque ir vencendo num ritmo máximo de 95 bilhões de dólares por mês, a serem confirmados, possivelmente, a partir das próximas reuniões em 3 e 4 de maio.

Especificamente, foram surpreendentemente francos com a grandeza de sua surpresa com o quadro inflacionário que, realmente, deteriorou muito nos últimos meses: uma inflação corrente de 7,0% ao ano é algo que algumas gerações nunca testemunharam. Citaram diversas métricas de inflação que vieram acima do esperado e, com isso, provavelmente exigirão uma postura ainda mais agressiva de Powell, levando o mercado como um todo a precificar amplamente uma alta de 50 pontos-base na próxima reunião.

De forma resumida, os fatos são esses. No entanto, achei que valia a pena escrever esse texto pela reação muito incomum do mercado depois dela, algo que normalmente não ocorre depois de reuniões do BC americano. Mesmo com um tom mais altista de juros e preocupado com a inflação, as taxas de juros do mercado americano se comportaram como se não estivessem acreditando nesse discurso. Nos vencimentos mais longos, de 30 anos, as taxas subiram 6 basis points, demonstrando um questionamento na capacidade das medidas anunciadas em conter a expansão econômica e a inflação, isso mesmo depois de realizar subidas agressivas desde a última reunião em um movimento tão forte que nunca havia sido visto na história americana, conforme imagem abaixo:

Taxas de juros norte-americanas com prazo de 30 anos

Fonte: Tradingview.com

Num intervalo de praticamente 4 meses, a taxa de referência para todos os financiamentos imobiliários subiu 100 pontos-base (1%), saindo de 1.67% ao ano para 2.67%. Esse movimento continuou mesmo depois da divulgação da ata e esse tipo de reação, uma vez que o Fed tem um status quase que sagrado dentro da comunidade financeira mundial, é uma anomalia.

Difícil entender exatamente as razões para tal comportamento, mas uma possibilidade é que os erros de diagnóstico do Fed (da natureza do choque inflacionário que chamou de “passageiro”, mudou para “transitório” e depois chamou de “disseminado”), tenha feito com que uma parte da população tenha perdido um pouco sua fé na instituição. 

Esse tipo de coisa, nesse caso, não é tão difícil de se reconquistar, uma vez que basta o Powell ser mais agressivo e surpreender as pessoas com altas de juros mais fortes, mostrando um compromisso real em conter a alta inflacionária. Mas, sendo sincero, estou no grupo que acredita que ele vai continuar pecando por ser mais expansionista e não vejo essa credibilidade sendo recuperada no curto prazo: ele não vai arriscar provocar uma queda maior na bolsa americana com medidas mais fortes.

 

Rodrigo Natali

Nota do editor: você pode buscar a multiplicação do seu patrimônio em qualquer cenário, operando sua própria carteira multimercado. Com foco principal nos mercados de câmbio e juros, Rodrigo Natali mantém na Inv o programa “Você Gestor”, no qual simula uma carteira multimercado em tempo real, com trades em posições de índice futuro, dólar, S&P 500, ações e opções. O “Você Gestor” tem o suporte de Nícolas Merola, analista financeiro certificado (CNPI), que faz recomendações de investimento com base na estratégia de Natali. Para saber mais, clique aqui.

 

Conheça o responsável por esta edição:

Rodrigo Natali

Estrategista-Chefe

Rodrigo Natali tem graduação e MBA pela FGV. É especialista em câmbio e macroeconomia, tem 25 anos de experiência no mercado financeiro, tendo passado por diversas instituições nacionais e internacionais onde exerceu a profissão de trader e gestor de fundos de investimento multimercado.

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