Briga de modelos

4 de fevereiro de 2022
Ontem fomos testemunhas de um evento de stress que começou, na verdade, no dia anterior e acabou escalando rapidamente e com várias partes sendo envolvidas. Gostaríamos de nos aprofundar nesse assunto.

Briga de modelos

Por Rodrigo Natali

 

Caro(a) leitor(a),

Grande parte da liquidez dos mercados e do risco que é possível correr não vem apenas de medidas tradicionais macroeconômicas, como agregados monetários ou taxas de juros. Ela vem de coisas mais técnicas que, no curto prazo, são muito mais importantes para os modelos de risco dos bancos e dos fundos: a volatilidade e as correlações entre ativos.

Praticamente desde o começo dos anos 80, por exemplo, uma vez que o risco da inflação persistente nos Estados Unidos foi eliminado, começou a desenvolver uma correlação entre dois ativos, a bolsa e os bonds norte-americanos muito fortes. 

Basicamente, quando um perdia, o outro ganhava. Se alguém fosse capaz de comprar a quantidade certa dos dois, mesmo nos momentos de stress, não perdia muito dinheiro e, no longo prazo, os dois tendiam a se valorizar nos momentos mais calmos. 

Foi daí que surgiu o modelo de paridade de risco, cujo principal patrocinador foi o Ray Dalio, que resultou no maior hedge fundo do mundo, a Bridgewater. Esse tipo de carteira conseguia explorar ao máximo os modelos de risco das bolsas, fazendo posições muito grandes com pouca chamada de margem, o que por si só tem um efeito tão grande quanto um QE (Quantitative Easing) ou uma queda de juros. 

No entanto, estamos vendo há um tempo um certo problema nesse modelo e ontem foi um dia desastroso para isso. Desde que os juros dos títulos públicos dos países foram para perto de zero, a capacidade de valorização desses se tornou muito mais limitada. 

Além disso, ela estava ali porque os Banco Centrais também deixavam o preço artificial por comprar grandes volumes mensalmente, processo esse que reduziu mas que ainda não terminou em geral. E também , mais recentemente, esses títulos em geral (e há muitos exemplos na Europa e na Ásia) começaram a se desvalorizar rapidamente, mesmo em dias que as bolsas caíam.

Ontem, tivemos essa quebra de correlação em esteroides, um movimento que muda tudo para os modelos de risco das bolsas e bancos. Porque no pior dia para o Nasdaq, desde o fatídico limite de baixa de 2020, tivemos um sell-off na dívida mundial que pegou de bunds alemão, a JGB, japoneses e a taxas de swap curtas no Euro, que foi na direção oposta do esperado. 

As commodities continuaram subindo, o que também atrapalha  a inflação e, apenas para completar a tempestade perfeita, o dólar despencou lá fora contra as outras moedas depois de uma surpresa com o tom da Lagarde na entrevista após a reunião do Banco Central Europeu.

Logo, os ativos se deterioraram muito e isso por si só já deveria causar hoje um grande Margin Call, mas como os títulos colocados em margem de garantia também caíram de valor, assim como as correlações foram quebradas fazendo com que o riscos percebidos pelos modelos subisse. 

Temos 3 razões técnicas muito fortes que podem forçar muito investidores a serem forçados a liquidarem suas posições. Muita liquidez e capacidade de carregar posições vem do patrimônio de um fundo ou do resultado da próxima reunião do FED, mas uma parte ainda maior vem de dentro dos modelos de risco do mercado, que quando começam a entrar em conflito, deixam as pessoas sem muita opção a não ser reduzir o risco. 

Um abraço,
Rodrigo Natali

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Conheça o responsável por esta edição:

Rodrigo Natali

Estrategista-Chefe

Rodrigo Natali tem graduação e MBA pela FGV. É especialista em câmbio e macroeconomia, tem 25 anos de experiência no mercado financeiro, tendo passado por diversas instituições nacionais e internacionais onde exerceu a profissão de trader e gestor de fundos de investimento multimercado.

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