Mercadores da Noite #245 Escritas e superstições

9 de outubro de 2021
Para quem pensa que os diversos mercados são movidos apenas por fundamentos e gráficos, gostaria de apresentar um novo fator que altera as cotações.

Caro(a) leitor(a),

Para quem pensa que os diversos mercados são movidos apenas por fundamentos e gráficos, gostaria de apresentar um novo fator que altera as cotações.

Refiro-me às escritas e superstições.

“Escrita, para quem não está familiarizado com este sentido do vocábulo, é, segundo definição do dicionário Houaiss, “o que constitui uma rotina ou aparenta constituir uma rotina.”

Exemplo: “A escrita de que o River nunca vence o Boca na Bombonera em jogo noturno foi quebrada ontem. É verdade que o único gol dos Gallinas aconteceu em um pênalti que não existiu.”

Em 1929, a máxima do bull market dos Roaring Twenties (Esfuziantes Anos Vinte) foi alcançada no dia seguinte ao do Labor Day (Dia do Trabalho), feriado que, nos EUA, é comemorado (ao contrário de quase todos os países do mundo, que o fazem no dia Primeiro de Maio) na primeira segunda-feira de setembro.

Eu conto esta história em dois dos meus livros:

Na página 31 de Projeto Maratona – Desmutualização e IPO da BM&F (Editora  Cultura, 2009), está escrito:

O DIA DO TRABALHO (Labor Day), nos Estados Unidos, é comemorado na primeira segunda-feira de setembro e marca o final das férias de verão, temporada também conhecida como “driving season”. Em 1929, o Labor Day caiu em 2 de setembro, um dia excepcionalmente quente na Costa Leste. Houve congestionamento gigante nas estradas de acesso a Nova York. No interior abafado dos carros parados, muitos com os radiadores fervendo, as famílias se queixavam do calor. As crianças resmungavam ao se lembrar da volta às aulas no dia seguinte.

Na terça-feira, 3 de setembro, o Serviço de Meteorologia informou que a temperatura havia batido o recorde do ano. Com muitos investidores e especuladores de volta ao mercado, a bolsa abriu firme e manteve-se firme o dia todo. O volume de negócios foi de 4.438.910 ações. Tudo indicava que o bull market permanecia intacto. Mas não    só o calor fazia a máxima do ano. As cotações da bolsa naquela terça-feira aparentemente trivial marcaram o topo dos Anos Vinte. Mas isso, é óbvio, só se descobriria mais tarde. Às custas de grande padecimento.”

Nas páginas 162/164 de “1929: quebra da bolsa de Nova York – a história real dos que viveram um dos eventos mais impactantes do século”, edição da Inversa, eu me estendo sobre o assunto.

Só que aqui nesta crônica vou transcrever apenas o início e o fim do episódio:

Terça-feira, 3 de setembro, primeiro dia útil após as férias de verão. Charlton MacVeagh mastigou às pressas seu café da manhã, beijou Adele e partiu para Wall Street. Tal como a maioria das pessoas envolvidas com o mercado, MacVeagh detestara os três dias sem ação na Bolsa.

O metrô para Downtown estava superlotado e sufocante. Pudera. A previsão meteorológica estimava que seria o dia mais quente do ano. A temperatura máxima esperada na área de Nova York era de 35º centígrados.De pé num dos vagões, ensanduichado entre outros passageiros, Charlton MacVeagh mantinha a mão direita firmemente agarrada numa das alças de apoio dependuradas em uma barra de metal cromado presa ao teto, paralela ao sentido do trem. Ele conseguia ler um exemplar do The New York Times, que segurava em sua mão esquerda acima das cabeças das pessoas sentadas nos bancos. Para mudar de página era necessária uma ginástica de contorcionismo. Assim Charlton pôde ler as notícias principais.
...

O índice industrial Dow Jones, tal como a astróloga Evangeline Adams previra na véspera para a WJZ NBC, subira aos céus, fechando no nível recorde de 381,17.

Embora quase ninguém desconfiasse disso, esse nível seria o maior do grande bull market dos anos 20, e só voltaria a ser atingido um quarto de século mais tarde, em 1954, após as tragédias da Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial.”

Pois bem, neste ano de 2021, os índices Dow Jones, S&P500 e Nasdaq fizeram seus highs nos dias próximos ao Labor Day, sendo que o Nasdaq bateu máxima exatamente na terça-feira fatídica.

Antes de mais nada, não é certo que as bolsas americanas já fizeram seus highs do ano. Mas, se acontecer isso, e é bem provável que aconteça, vai se iniciar uma escrita.

Existe uma outra que diz que os grandes crashes sempre ocorrem em outubro. E vejam que ainda estamos no dia 9 do mês.

Uma das mais curiosas superstições de Wall Street é aquela que reza: “o mercado sobe nos anos em que o Super Bowl (final do campeonato de futebol americano) é vencido por uma equipe da National Football Conference.”

Entre 1967 e 2003 isso aconteceu 68% das vezes, o que para mim não chega a ser estatisticamente relevante. Mas há gente que acredita e vai nessa onda.

Outros julgam que se deve comprar na Lua Nova e vender na Lua Cheia.

Conheci um trader, muito bem-sucedido na profissão, que jamais operava nos dias 13.

No fundo, tudo isso parece ser uma grande bobagem. Mas, depende. Se as pessoas começam a acreditar, esses vaticínios se tornam autorrealizáveis.

Yo no creo en brujas, pero...

Um ótimo fim de semana para todos.


Ivan Sant’Anna

 

Conheça o responsável por esta edição:

Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

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