Mercadores da Noite #5 - Para onde o mercado está olhando?

7 de junho de 2017
Barato e caro são conceitos subjetivos.

Mercadores da Noite

Caro leitor,

O mercado sempre segue na direção do juízo da maioria dos investidores e especuladores, levando em conta, é claro, o poder econômico de cada um. Parece óbvio escrever isso, mas é bom lembrar que alguém que investe um milhão de reais tem uma opinião (em termos mercadológicos) mil vezes mais influente do que aquele que aplica mil. Portanto é um julgamento ponderado, mas, considerada essa distribuição de pesos, é ela (opinião da primazia) que prevalecerá, independentemente do que você, caro leitor, ache de como as cotações reagirão a determinado fato.

Um bom exemplo é o que aconteceu com as ações e com os títulos de renda fixa da Petrobras, inclusive e principalmente os negociados em dólares, no mercado americano, quando a empresa, sob a gestão de Graça Foster e durante o governo Dilma Rousseff não publicou seu balanço simplesmente porque se perdeu nos números. A roubalheira era tanta que ficou difícil apurar quais os ativos que eram mesmo ativos (com desculpas pelo trocadilho) e quais os que eram ruínas ou simplesmente haviam virado fumaça. Foi a época em que, na contabilidade da estatal, dois mais dois equivaliam a menos quatro.

Naquele momento de pânico no mercado, quem parou para pensar (e os mais sensatos e mais cascudos fizeram isso aqui e lá fora) comprou ações e obrigações da Petrobras, calcado no raciocínio mais do que lógico: o Tesouro não vai deixar quebrar, mesmo que tenha de lançar nas costas do contribuinte o prejuízo da ladroeira. E quem adquiriu ações ou títulos da empresa se deu muito bem. Se comprou alavancado, enricou. Caso tenha se limitado ao “papai e mamãe”, dobrou ou triplicou o rico dinheirinho que pôs ali.

O balanço acabou saindo (mal e porcamente, mas saiu), Dilma foi defenestrada e Temer pôs na empresa o Pedro Parente, que passou a administrar a Petrobras como um legítimo CEO profissional. Mas a oportunidade de uma grande porrada tinha sido lá atrás quando as ações não se esfarinharam porque a maioria (ponderada, repito) percebeu o óbvio rodriguiano e comprou. Comprou aqui em reais e comprou em Nova York em dólares. Eu mesmo fiz minha fezinha, embora sem alavancar (sniff).

Por essas razões muitos traders operam por gráficos, que revelam o que ainda não veio à luz. Vem daí os bullish haramis do candlestick, um método de analise técnica que os japoneses, há muitos séculos, usavam para interpretar o mercado de “arroz vazio” – arroz futuro, da safra do ano seguinte –, os fundos duplos, as cabeças e ombros invertidos, os fundos redondos, as ilhas e as agulhas dos gráficos tradicionais, os baixos RSI, Relative Strenght Index(Índice de Força Relativa), dos indicadores de momentum, que mostram claramente que quem tinha de vender já vendeu e que, sem novos vendedores, o preço sobe.

Isso não quer dizer que aquilo que está muito barato (barato é um conceito subjetivo) deve ser comprado e que o que está caro (mais subjetivo ainda) deve ser vendido. Grandes oportunidades de venda a descoberto (ou de compra de puts) podem surgir em um novo low. O mesmo acontece com um novo high. Imaginem quem comprou 100 ações da Microsoft a 21 dólares por ação – uma nova máxima até então – em 13 de março de 1986, dia da primeira IPO da empresa. Entre bonificações (splits) e valorização o felizardo, quem na época investiu 2.100 dólares, tem hoje mais de dois milhões de dólares.

Certa ocasião eu comprei um grande lote de açúcar futuro na CSCE (Coffee, Sugar and Cocoa Exchange), em Nova York, só porque estava barato. Barato demais. Abaixo de cinco centavos de dólar a libra-peso. E ficou nesse ramerrame durante três anos, sendo que toda vez que eu tinha de rolar a posição, de três em três meses, pagava os custos de corretagem e de contango(situação na qual os futuros mais longos custam mais do que os mais curtos). O mesmo aconteceu com o café e com o cacau. Comprei porque estavam de graça e me ferrei.

Na outra ponta, não foram poucas as ocasiões em que vendi o S&P 500 quando o mercado fez novas máximas e eu (só eu) achava que um short seria o trade de minha vida.

Foi levando essas escovadas que aprendi que não existe barato nem caro. Existe o que vai subir e o que vai cair. 

Em minha opinião, a permanência ou não de Temer, um mandato de 30 dias de Rodrigo Maia, um eleito indireto, tudo isso está precificado no mercado de ações. O que não está precificado é um eventual (e altamente improvável) governo do PT eleito em 2018. Caso contrário, as reformas trabalhista e previdenciária irão acabar sendo implantadas, mesmo que meio tronchas e mesmo que o presidente escolhido diretamente no ano que vem, seja ele quem for, jure de pés juntos que não irá propô-las ao Congresso.

Para quem, como eu, já operou com inflação acima de 50% ao mês, com confiscos, congelamento de salários e preços, tablitas, moratória externa, reformas monetárias com cortes de zeros na moeda, o que está acontecendo agora é pura normalidade.   

Eu acredito que o momento do mercado de ações é de se operar tendo em vista o comportamento das empresas e dos setores em que atuam. Nada tem a ver com 2016 quando o Brasil esteve na encruzilhada entre se “venezuelar” ou mudar de rumo, hipótese esta que acabou acontecendo.   

Dá para acreditar, embora com o dedo no gatilho do descrédito. É bom frisar que os bons investidores, operadores, especuladores, traders, administradores de carteiras e de fundos de investimentos são os que acertam. Ruins são os que erram. 

Se você quer consertar o país (ou o mundo), faça um concurso para juiz, ou para defensor público, funde uma ONG, se voluntarie para uma causa nobre, tente um mandato eleitoral, saia noite a dentro distribuindo sopa para os sem-teto, divirta pacientes em um hospital infantil.   

Aliás, você pode até fazer tudo isso, mas separe as coisas. Faça como Bill Gates, John D. Rockefeller, Warren Buffett, George Soros ou Ted Turner. Na hora de morder, morda. Na hora de assoprar, assopre.

Conheça o responsável por esta edição:

Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

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