Mercadores da Noite #25 - Preciso morrer até abril de 2027

18 de outubro de 2017
Como está a sua previdência?

Mercadores da Noite

Caro leitor, 

Jorginho Guinle, o maior dos playboys brasileiros, e um dos grandes da História, jamais trabalhou. Nascido em berço de ouro, dedicou-se às delícias do jet set (desculpem-me o termo anacrônico) internacional, namorou algumas das mulheres mais bonitas do planeta – Rita Hayworth, Marilyn Monroe, Kim Novak, Anita Ekberg, Ava Gardner, etc., etc. Mas morreu pobre. 

Herdeiro de uma das maiores fortunas do Brasil, Jorginho nunca se preocupou em poupar ou investir. Simplesmente achava que viveria no máximo 80 anos, idade avançadíssima para quem nascia em 1916, como ele. Teve o “azar” de chegar aos 88. Passou seus últimos anos vivendo da ajuda de amigos e almoçando e jantando de graça no Copacabana Palace, que fora fundado e permanecera durante décadas como posse da família Guinle.

E foi no Copa que Jorginho Guinle se suicidou, após ter alta de um hospital público, no qual fora tratado de uma arritmia cardíaca e de um aneurisma na aorta abdominal. Suicidou-se com classe, alternando doses cavalares de soníferos com goladas de milkshake de baunilha.

Portanto, a Previdência de Guinle era seu próprio dinheiro, algo como cem milhões de dólares, gasto em proporções descomunais e que só por isso acabou.

O curioso é que as pessoas normais (excetuando-se os funcionários públicos), que precisam de verdade da Previdência, não podem confiar nela.

Vejamos o meu caso:

Durante quase toda minha vida recolhi para o INSS sobre vinte salários mínimos. Portanto deveria estar ganhando hoje 18.740,00 reais mensais da Previdência oficial. Mas não ganho. Nem eu nem ninguém da iniciativa privada. Meu contracheque de aposentado é de 3.832,80 reais, insuficientes para pagar o condomínio de meu prédio mais a mensalidade do plano de saúde, que dirá para comer, ter eletricidade, gás, telefone, computador, comprar remédios, tomar uma cervejinha no bar da esquina, etc., etc.

Felizmente, durante a maior parte de minha vida, sempre tive algum tipo de poupança. Não confio nem nunca confiei em governos, muito menos nos nossos. Mas, comigo, as previdências privadas também não deram certo. Fiz duas, uma nos Estados Unidos, outra aqui, mas as abandonei quando constatei que pagava muito para receber pouco no futuro.

Desde o século passado eu já havia calculado que teria de ter dinheiro suficiente, sem contar o valor do apartamento onde moro, para gastar 2.500,00 dólares por mês (mesmo após 23 anos de real, não sinto confiança em nossa moeda para fazer projeções de longo prazo com ela). Acumulando rendimentos com descapitalização, isso me possibilitará viver até abril de 2027, quando terei 86 anos de idade.

Eu refaço esses cálculos todos os meses. Considero nos cálculos minha aposentadoria somada aos resultados de meus investimentos, mais direitos autorais, recebimentos por crônicas, palestras, vendas de direitos de filmagens de meus livros e alguns extras – outro dia, por exemplo, a BBC me pagou mil dólares para simular uma partida de autobol (futebol de automóveis), destruindo um fusca velho que eles compraram e pintaram com as cores do Brasil.

Houve outras bonanças: durante seis anos fui roteirista da TV Globo, época em que meu salário na emissora se juntava às demais rendas.

De abril de 1995, quando larguei o mercado para ser escritor, até agora, minha situação financeira, com altos e baixos, é claro, se manteve num canal de alta (higher highs, higher lows). Fazendo economias e trabalhando 365 dias por ano, o balanço de Ivan Sant’Anna melhorou.

Só não posso me esquecer que tenho 77 anos de idade e que, de repente, posso sofrer um AVC e perder toda a capacidade produtiva. Nessa hipótese, sobrarão apenas os direitos autorais, que tenderão a diminuir uma vez que não acrescentarei mais nada ao meu portfólio literário.

Volta e meia me comparo com outras pessoas que têm a minha idade e são aposentadas (caso da maioria). Tirando os funcionários públicos, que são uma casta especial e que, embora sendo 10% dos beneficiários da Previdência, recebem metade do valor total, os demais são obrigados a viver de seus ganhos do INSS ou do fruto de seus investimentos. Caso contrário, têm de se conformar em trocar seus planos de saúde pelo SUS, morar em casas menores em bairros mais baratos, enfim, entrar em um canal de baixa irreversível em sua qualidade de vida (lower highs, lower lows).

Vamos a um cálculo sem precisão atuarial.

Com taxas de juros reais em torno de cinco por cento, atualmente é preciso, grosso modo, ter pelo menos uns dois milhões de reais aplicados num bom fundo de renda fixa para garantir uma renda mensal de dois mil e quinhentos dólares.

Infelizmente, nem todos têm a sorte de morrer de repente, quem sabe até dormindo, ou, melhor, dormindo em um avião que se choca contra uma montanha (esta é a minha preferência), hipótese em que você morre sem saber e ainda deixa uma bela indenização para a família, paga pela empresa aérea.

O trágico é a morte por doença prolongada, acompanhada de remédios caríssimos e até de cuidadores, mais caros ainda.

Mas vamos ao caso da maioria das pessoas que se aposentaram, seja porque estão cansadas, seja porque é difícil para um velhinho, ou velhinha, arranjar emprego, e têm investimentos para viver com dignidade.

Quando as taxas de juros reais encolhem muito, e o mercado de ações entra em um bull market, como agora, muita gente tende a investir na bolsa. Mas aplica em renda variável com espírito de renda fixa (onde se ganha sempre, ou quase sempre).

Essa classe de investidor, quando a bolsa rende mais do que os CDBs, fundos, Tesouro Direto, etc., etc., dando um retorno maior do que aquele que recebiam na renda fixa, tende a pular fora das ações e voltar para suas origens.

Por essa razão, toda vez que o Ibovespa faz novas máximas, logo perde o momentum, desacelera, ou cai um pouco, pois existem milhares de pessoas com o dedo no gatilho, prontas a pular fora.

O mercado, notem bem, está derivando, com pouca propulsão, pronto para fazer um topo.

Conheça o responsável por esta edição:

Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

A Inv é uma Casa de Análise regulada pela CVM e credenciada pela APIMEC. Produzimos e publicamos conteúdo direcionado à análise de valores mobiliários, finanças e economia.
 
Adotamos regras, diretrizes e procedimentos estabelecidos pela Comissão de Valores Mobiliários em sua Resolução nº 20/2021 e Políticas Internas implantadas para assegurar a qualidade do que entregamos.
 
Nossos analistas realizam suas atividades com independência, comprometidos com a busca por informações idôneas e fidedignas, e cada relatório reflete exclusivamente a opinião pessoal do signatário.
 
O conteúdo produzido pela Inv não oferece garantia de resultado futuro ou isenção de risco.
 
O material que produzimos é protegido pela Lei de Direitos Autorais para uso exclusivo de seu destinatário. Vedada sua reprodução ou distribuição, no todo ou em parte, sem prévia e expressa autorização da Inversa.
 
Analista de Valores Mobiliários responsável (Resolução CVM n.º 20/2021): Nícolas Merola - CNPI Nº: EM-2240