Mercadores da Noite #117 - O fascinante mundo das commodities

13 de maio de 2019
Do boi gordo ao bicho da seda, passando, claro, pelo petróleo, os contratos futuros de produtos primários trazem inúmeras possibilidades de ganhos a investidores antenados

Nota do editor: Caro leitor, hoje o Ivan trata das peculiaridades dos mercados de commodities. E eu deixo o convite para O Melhor Curso de Opções do País. Aqui está o link para o curso e para ver como ganhar em qualquer cenário. Abraço!

Caro leitor,

Em meados dos anos 1980, um dos mercados futuros mais emocionantes do Brasil era o de boi gordo, negociado na Bolsinha, como era mais conhecida a Bolsa de Mercadorias de São Paulo.

Uma vez que o pregão funcionava apenas das 9h às 10h da manhã, quem perdia dinheiro naqueles 60 minutos tinha de sofrer um dia inteiro de trabalho em outros ativos. O contrário acontecia com os vencedores.

O boi era louco. Mercado totalmente manipulado por meia dúzia de especuladores de mãos fortes e bolsos recheados, não raro alguns meses de vencimento futuro fechavam em limite de baixa, com pool de vendedores, e outros em limite de alta, com fila de compradores.

Havia muita superstição. Os comprados faziam questão de almoçar em churrascarias rodízio. Os vendidos tornavam-se vegetariano da noite para o dia. Com razão. Imagine você, caro leitor, short no boi, tendo à frente um garçom com um espeto de picanha pingando sangue em seu prato.

Infelizmente, os mercados futuros de mercadorias andaram para trás no Brasil. Aos poucos que ainda restam, falta liquidez.

Pena que isso aconteça num país que é uma das maiores potências mundiais das commodities, como se pode constatar na tabela abaixo:

Um dos maiores problemas de nossos mercados futuros de commodities é a proximidade de fuso horário com os dos Estados Unidos. Então, os players tupiniquins preferem operar lá.

Sempre há uma commodity protagonizando um bull market ou sofrendo um crash. Quem opera around the world tem oportunidades permanentes de fazer fortuna da noite para o dia. Ou de perder uma grana roxa.

Digo isso por experiência própria, pois já me vi nas duas situações.

No momento, a grande sensação é o mercado de porco castrado (lean hogs), negociado na Chicago Mercantile Exchange. Isso porque a China, primeira colocada no ranking de produção, está experimentando uma queda de 10% em seus estoques, devido a um surto de febre suína.

Esse número é oficial, fornecido pelas autoridades chinesas. Alguns analistas reputados garantem que a perda se eleva a 30%.

O resultado é que a cotação dos hogs na Merc subiu 47,6% só este ano. Quem opera futuros sabe que 47,6% no spot podem significar até 500% num trade alavancado. Lucro/margem inicial. Essa é a conta.

Commodity das mais interessantes é o açúcar, que tanto pode ser o de cana como o de beterraba. São mais de 100 países produtores.
   
Para que haja um bull market de açúcar é preciso que aconteça algo como as setes pragas bíblicas (alguns livros sagrados dizem que foram dez). Um incêndio na Austrália, um furacão no Caribe, um inverno rigoroso na Ucrânia, uma seca no Brasil, etc.

Bull markets que merecem esse nome só aconteceram duas vezes no açúcar: em 1974 e 1980.
   
Se o caro amigo leitor não se lembra (e não deve se lembrar pois provavelmente não havia nascido), em 1974 a família Atalla, dona da Copersucar, se deu ao luxo de bancar um carro de Fórmula 1, o Copersucar, pilotado primeiro por Wilson Fittipaldi e mais tarde por seu irmão mais moço, Emerson.
   
Como se tal extravagância não bastasse (o Copersucar jamais ganhou coisa alguma), os Atalla patrocinaram sozinhos a transmissão pela TV da Copa do Mundo da Alemanha no ano do primeiro bull market.

Se, por um lado, o café é um mercado traiçoeiro, por outro pode ser o mais rentável. Eu já vivi as duas faces da moeda. Perdi até as cuecas, ao operar short numa seca. Enriquei em poucas horas, graças à geada devastadora de 1994.

Outro futuro fascinante é o de grãos, negociado principalmente em Chicago. Eis como descrevo um bull market de soja na página 57 de meu livro Os mercadores da noite, edição da Inversa:

“No fim de agosto e início de setembro, o mercado foi tomado por uma onda especulativa sem igual. Todo mundo comprava soja a futuro. Até os mensageiros do pregão de Chicago apostavam suas economias no mercado. Da Costa Leste, o pessoal de Nova York, geralmente mais ligado ao mercado de ações de Wall Street, começou a jogar na Bolsa de Chicago. Os boletins de meteorologia eram lidos avidamente pelos especuladores. Boatos davam conta de que iria faltar soja no fim da temporada e que os Estados Unidos, acreditem, seriam forçados a importar o produto da América do Sul e, até mesmo, da Europa.”

Bull markets de cacau duram anos, assim como duram anos os bear markets dessa commodity. Explica-se: enquanto um pé de soja ou de milho produz em alguns meses após o plantio, o cacau leva cinco anos para começar a dar frutos.

Sendo longo o ciclo da árvore, longo é o ciclo de seu preço.

Frozen concentrated orange juice (FCOJ), o popular suco de laranja. Os bull markets do FCOJ acontecem num período de poucos dias que precede o Natal, o Ano Novo e a primeira semana de janeiro.

A razão para isso é simples. Antes dessa quinzena de virada do ano, nunca acontecem geadas nas regiões de laranjais da Flórida. Após esse prazo, os frutos já foram colhidos.

Nas últimas décadas, depois que a China se tornou capitalista, mantendo o comunismo só no nome do partido único, seus habitantes se tornaram os fieis da balança, pelo lado do consumo, das commodities.
 
Imagine, caro leitor, mais de um bilhão de chineses comendo pato laqueado. Haja pato, haja açúcar.
 
Esse crescimento astronômico, detonado por Deng Xiaoping, mudou completamente os mercados de grãos, de petróleo, de cobre e de minério de ferro, só para citar alguns ativos.
 
A China é o maior parceiro mundial de quase tudo.

População por população, a Índia vem logo atrás. 1,4 bilhão contra 1,3. E os indianos têm o hábito de poupar em joias de ouro e prata. Quando as monções são boas, e a colheita, farta, aumenta o consumo de ouro e prata no subcontinente asiático, que engloba também Paquistão e Bangladesh.

Finalmente chegamos à mais importante das commodities. Refiro-me, é claro, ao petróleo.
 
Não é mais uma mercadoria que só sobe, tal como se acreditava nos anos 1970, época em que se dizia que as reservas mundiais iriam se esgotar em meados deste século 21.
 
Na verdade, se todos os países produtores extraíssem seu potencial, haveria superprodução.
 
Atualmente, para que haja um bull market de petróleo, é preciso que ocorra um squeeze (aperto temporário) provocado por uma guerra, um acidente ou incidente.
 
Nessas ocasiões, o mercado trabalha em backwardation. O vencimento mais curto do WTI (Western Texas Intermediate) na Nymex pode subir. Mas os preços lá na frente se mantêm estáveis.
 
Para que o preço do petróleo exploda (figuradamente), é preciso que haja as tais pragas bíblicas, que citei ao falar sobre o açúcar.

Restam as commodities exóticas. Estou me referindo ao azeite de dendê (palm oil), feijão vermelho (read beans), bicho da seda (silkworm), barriga de porco (pork belly) e cebolas (onions).

Prometo ao caro amigo leitor que brevemente escreverei uma crônica só sobre elas.

Ah, neve. Esqueci de mencionar a neve, commodity que pouca gente sabe que é negociada. Essa, eu nunca “treidei”.

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Um abraço,

Ivan Sant’Anna

Conheça o responsável por esta edição:

Ivan Sant'Anna

Trader e Escritor

Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Na newsletter “Mercadores da Noite” e na coluna “Warm Up PRO”, Ivan dá sugestões de investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.

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